sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

As verdades sobre a greve na UnB e o corte da URP


Texto do Professor Ileno, do IP-UnB
(ele faz parte da direitoria da Adunb)

URP, Greve, Desrespeito ao STF, Isonomia Salarial e Autonomia Universitária

A greve por nós instalada na UnB pelo pagamento integral da URP, a despeito da legitimidade política de sua pressão, está mascarando flagrantemente - e ferindo perigosamente – agressão a três princípios fundamentais na luta pela Universidade Pública, Gratuita e de Qualidade: o respeito ao tribunal máximo de nosso país, o princípio da isonomia salarial e, a tão propalada em prosa e versos (mas não em ações), autonomia universitária. Senão vejamos!

1. Os professores da UnB têm assegurado, por ação impetrada no STF (MS nº 26.156 - Relatora Min. Cármen Lúcia), baseada nos princípios da autonomia e da isonomia - ambos princípios fundamentais da nossa Constituição Federal, via liminar, o pagamento integral da URP na remuneração dos docentes nos seguintes termos:

“Defiro o pedido de medida liminar para determinar à autoridade indigitada coatora se abstenha de praticar atos tendentes a diminuir, suspender e/ou retirar da remuneração/proventos/pensões dos docentes substituídos a parcela referente à URP de fevereiro de 1989 e/ou impliquem a devolução dos valores recebidos àquele título, até a decisão final da presente ação.”

2. Portanto, por decisão liminar do STF, está claro que a determinação, em plena vigência, é de que a UnB se abstenha de retirar/suspender da remuneração (amplamente considerada), a parcela referente à URP (ou mesmo diminuí-la), até a decisão final da ação.

3. Assim sendo, juridicamente, a manutenção da URP está amparada pelo que o direito (e vejam que o nosso Reitor é advogado) chama de “coisa julgada” presente na vitória judicial, obtida por nós, junto ao STJ, e em vigor!

4. Conforme consta, a URP incide sobre o vencimento básico e algumas das gratificações percebidas pelos docentes quando são pagas em valores fixos e predeterminados pela legislação.

5. A incorporação da parcela nos vencimentos dos servidores se deu com a implantação do regime jurídico único, a partir de 1991, quando a remuneração passou a ser composta pelo vencimento básico, anuênios e quinquênios. Em seguida foi criada a GAE, que também passou a sofrer a incidência da URP, pois possuía como base de cálculo o vencimento básico, a exemplo do que também ocorria com anuênios e quinquênios.

6. Por outro lado, qualquer que seja o alcance da norma (posterior) não poderá afetar o princípio constitucional que veda a redução salarial (Art. 7º, VI e 37, XV da CF/88).

7. Portanto, outro princípio legal a ser resguardado é o da irredutibilidade salarial plenamente consolidada na jurisprudência. Ou seja, o valor nominal da remuneração vigente à época da instituição das referidas gratificações deve ser preservado.

8. Desde setembro que a UnB se encontra num embate “quase insano” para manutenção do pagamento de parcela significa dos salários de professores e funcionários.

9. No entanto, a greve iniciada e mantida sem ter como aliada fundamental a decisão judicial cristalina acima está colocando em risco estes princípios: o respeito à decisões de nosso tribunal maior, a isonomia e a autonomia universitária.

10. Na medida em que, pressionado incorretamente pelo TCU, tribunal que tem a obrigação de conhecer e respeitar uma decisão do STF, a Reitoria da UnB suspendeu o pagamento da URP, jogou os professores e funcionários técnicos-administrativos nas mãos de um “jogo manipulatório e conveniente” que envolve a Reitoria da UnB, o Ministério do Planejamento e agora o próprio Ministério da Educação.

11. Vamos aos contextos desta história recente...

Sobre os Atos Intempestivos da Reitoria

1. Em 31/08, a diretoria da ADUnB foi convocada pelo Magnífico Reitor para uma reunião, às 14 horas e 30 minutos, sobre o pagamento da extensão da URP sobre GEMAS e RT. Fomos à época surpreendidos nessa reunião de que haveria um possível recuo da posição da reitoria sobre o pagamento da extensão desta URP, que vinha sendo realizado desde fevereiro de 2009, sendo instados a dar uma posição sobre o fato, entretanto, o prazo (absurdo) era até o final do expediente do dia (31/08), que era não só exíguo, mas precipitado e pressionador, dado que tinham conhecimento das investigações do TCU desde 26/02 (com a notificação do TCU à SRH da época para subsidiar estudos sobre o assunto), ou 03/06 (onde o Dr. Alessandro Laranja, Secretário de Fiscalização de Pessoal do TCU, agradece (Ofício 0863/09) a colaboração prestada pela Reitoria no “livre acesso as instalações do SRH” e “provisão de documentos para a referida investigação”), ou 23/07 (quando foi expedida a comunicação processual de “oitiva”), ou 24/07 (nova expedição de comunicação processual (observem a imediaticidade, desta vez de “audiência”), recebida na Reitoria no dia 31/07, ou, ainda, 19/08, quando saiu a determinação do TCU (quando a UnB recebeu?)

2. Tudo isto acontecendo sem sermos informados ou consultados, vez que de interesse dos professores, num flagrante desrespeito ao nosso histórico papel de negociação e reflexão sobre nossos interesses.

3. O que deixava clara a atual posição da Reitoria sobre a não consideração da atual Diretoria da ADUnB, portanto, dos próprios professores a ela sindicalizados, colocando-nos na inadequada posição (jurídica, acadêmica e sindical) de termos que refletir com dados obscuros, mínimos e manipulados, posto que já tinham conhecimento de toda a situação.

4. A Diretoria, coerente com a defesa inconteste do professor, em especial diante de situações de pressão e flagrante manipulação de informações, questionou se a Reitoria estava recuando da posição de fevereiro (Ato 372/2009, de 16/02/09), que determinava a “incidência da URP nos valores dos vencimentos básicos e demais parcelas remuneratórias dos docentes da UnB”, a partir de 02/02/2009, ao que o Magnífico Reitor afirmou categoricamente, à época, que “SIM”.

5. Ato contínuo, em 01/09, o Magnífico Reitor editou o Ato 2.076/09, determinando à SRH “que observe a extensão da coisa julgada obtida nos Mandados de Segurança n. 927 e 928 que tramitaram perante o Superior Tribunal de Justiça, bem como nas ações individuais, quanto ao cálculo de remuneração de docentes”, tornando sem efeito o Ato 372/09.

6. Em obediência, em 03/09/09, o Secretário de Recursos Humanos, através da Circular 045/09, comunicando que a Secretaria excluiria da remuneração dos professores desta instituição os valores referentes à incidência da URP sobre a Gratificação Específica do Magistério Superior (GEMAS) e a Retribuição por Titulação (RT).

7. Numa clara confusão administrativa, jurídica e política, em 04/09, novamente o Secretario do SRH informa (agora extemporaneamente) o “cumprimento da Medida Cautelar do TCU”, embora a decisão final não tenha sido prolatada.

8. Quanta confusão administrativa, jurídica e política!

9. Diante desse cenário, nova petição foi encaminhada à Ministra Cármen Lúcia, nos autos do Mandado de Segurança nº 26.156, oportunidade em a Assessoria Jurídica da ADUnB formulou o seguinte pedido:

“Em face do exposto, considerando que a remuneração dos docentes será creditada em 1º/11/2009, bem como que o pagamento da parcela URP pode ocorrer com base na rubrica até então utilizada ou em outra, se assim entender Vossa Excelência, ainda que mediante a elaboração de folha suplementar, o Sindicato Impetrante requer que Vossa Excelência digne-se a oficiar o Magnífico Reitor da Fundação Universidade de Brasília e a Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão – MPOG, para que procedam ao imediato cumprimento da decisão proferida no presente feito, em 7/10/2009, sob as penas da lei.”

10. Na oportunidade, além de reafirmar que tanto o TCU quanto a Reitoria da UnB se abstivessem de praticar atos contrários à liminar original, a Ministra Cármen Lúcia deixou claro que “os efeitos da liminar atingem também aqueles que ingressaram nessa instituição de ensino superior após o deferimento da medida liminar no presente Mandado de Segurança”.

11. Em que pese a referida decisão, a Reitoria da UnB informou a existência de novos percalços impostos ao pagamento da URP de fevereiro de 1989. Além de óbices administrativos supostamente impostos pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão – MPOG, haveria um processo administrativo em curso perante o Ministério da Educação. Com isso, materializou-se uma vez mais o descumprimento da liminar deferida pelo STF, já que, até o momento, 316 professores não receberam a URP (integral ou parcial) do mês de novembro, a ser paga em dezembro de 2009. Entre eles, existem, predominantemente, professores novos. Entretanto, alguns professores mais antigos também estão sendo atingidos pelo corte.

12. Ao suspender o pagamento, agora não mais pressionado pelo TCU, a Reitoria claramente entregou de bandeja ao MPOG, e agora ao MEC, não só o corte dos salários dos professores e funcionários, mas, e perigosamente, entregou ao governo os princípios da autonomia e da isonomia salarial, volto a dizer, garantidos na constituição.

13. O que de fato está claramente ocorrendo é que o MPOG em conjunção com a Reitoria está “analisando os dados dos pagamentos” e, portanto, o salário dos professores e servidores, ao Governo Federal que, por certo, tem toda intenção de reduzi-los.

14. Por outro lado, a Reitoria da UnB, agora procura explorar a ambigüidade da greve instalada na UnB (que, correta e convenientemente, está mobilizando a indignação de professores afetados pelo corte, em especial os “308 novatos” e 186 técnicos-administrativos), delegou para o MPOG e o MEC dois de seus princípios fundamentais de aperfeiçoamento do ensino superior no país: a isonomia e a autonomia.

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15. Assim sendo, o que vemos agora é uma greve de legítima indignação que alia interesses diversos: A próxima eleição da ADUnB, a ser deflagrada no ano que vem, de partidos de esquerda radical que “querem derrubar o governo federal a qualquer custo”, de lideranças que querem construir suas plataformas políticas pessoais. A isso se soma um perigoso jogo de desrespeito ao STF, abre espaço para o questionamento da isonomia salarial dos professores e, o pior a meu ver, dá um golpe final na autonomia universitária, que ainda está mantida pela sabedoria da liminar do Supremo Tribunal Federal.

16. Desde estes fatos, a SECOM, órgão principal de divulgação (e manipulação comunicacional) da atual Reitoria tem trabalhado com informações distorcidas, imprecisas, claramente manipulatórias, contribuindo para uma grande confusão entre a comunidade, em especial os novos professores. Qualquer pesquisa despretensiosa no site da UnB – ou mesmo no “oráculo mundial” Google – evidencia as contradições e os jogos feitos por esta Secretaria em desfavor de nossa luta (como exemplifico abaixo).

17. Por outro lado, uma rápida leitura dos Boletins no site da ADUnB, mostram o caminho tomado pela atual Diretoria para construir uma greve pontual, coerente com os debates, as forças em jogo – mesmo que equivocadas e emocionais – e as evidentes conquistas feitas pelas ações construídas (idem abaixo).

18. Com estes contextos e cenários, está ficando óbvio o que virá, se persistirmos na confusão de objetivos e discursos desta greve em particular: o governo terá a clareza do que deve cortar definitivamente dos salários dos professores, como conseqüência das ações da Reitoria, dos militantes que perderam a direção da ADUnB na eleição passada, subsidiará outras ações do TCU e, finalmente, o mais perigoso de todos estes equívocos, poderá reunir forças para “pressionar” o Supremo Tribunal Federal pela retirada definitiva de nossa URP.

19. A “mobilização-manipulação” política de uma greve recém instalada que, na tradição da política instalada internamente nos últimos tempos na UnB, somente pensa por fatos circunstanciais e se mostra efetivamente incompetente para discutir seus princípios maiores e primeiros a favor de jogos de linguagem políticos.

20. Se assim persistirmos na greve, será um triste fim para um segmento da sociedade, os professores, que “enrolando-se nas próprias pernas” não consegue fazer avançar análises e ações efetivas de manutenção da universidade pública, gratuita e de qualidade, para além das “palavras de ordem”, buscando sempre no “governo federal” as mazelas de nossas faltas de conseqüência. Haja “atribuição de causalidade externa”, como se diz na Psicologia.

Ileno Izídio da Costa
Professor Adjunto do Departamento de Psicologia Clínica da UnB

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